Todos os caminhos levam ao Cerrado

Foto: Arpec

Associação de mulheres extrativistas  utiliza frutos do bioma como fonte de renda em Mato Grosso 

Por Iasmim Sousa* 

 Baruzeiro, árvore nativa do Cerrado e também presente em regiões de transição do Pantanal, pode passar despercebido por olhares desatentos. Entre sua folhagem densa e tronco que pode chegar a 25 metros de altura, ele esconde em seu fruto a castanha de baru ou cumbaru, amêndoa comestível que se tornou importante fonte de renda para uma associação de mulheres dos municípios de Mirassol D’Oeste e Cáceres, na região oeste de Mato Grosso. 

A Associação Regional das Produtoras Extrativistas do Pantanal (ARPEP) foi criada como uma alternativa para que grupos de mulheres conseguissem comercializar sua produção de pães e biscoitos enriquecidos com farinha de babaçu, cumbaru e pequi, frutos nativos do Cerrado. Atualmente, a ARPEP atua em três grupos que reúnem em torno de 35 mulheres. 

Dois grupos estão localizados em Cáceres, um no Assentamento Facão, a 20 km da cidade, o “Amigas do Cerrado”, e outro a 90 km do município, no Assentamento Corichinha, divisa com a Bolívia, chamado “Amigas da Fronteira”. Em Mirassol D’Oeste existe o “Grupo Margaridas”, do Assentamento Margarida Alves. Cada um deles trabalha com um fruto mais predominante em sua própria região. O Amigas do Cerrado utiliza o cumbaru, o Amigas da Fronteira trabalha com pequi e o Margaridas com babaçu.

 A Associação surgiu informalmente em 2003, a partir de reuniões promovidas pela Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE – Solidariedade e Educação), mas foi apenas em 2009 que a ARPEP conseguiu sua regularização e ganhou CNPJ para poder comercializar oficialmente seus produtos. Hoje, a associação entrega pães e biscoitos para aproximadamente 45 escolas da zona urbana e rural de Cáceres, por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). 

Em 2003, Rosimeire Aparecida Siqueira, atual presidente da associação e moradora do Assentamento Corichinha, começou a participar dos grupos informais para poder ter um tipo de fonte de renda. “Eu era uma mãe solteira, tive uma filha com 14 anos. Então, eu comecei a participar do grupo de mulheres para gerar uma renda para sustentar minha filha, porque morava com minha mãe e mais duas irmãs, minha mãe era separada do meu pai. E o único meio que eu achava era participar da associação para me levar uma renda a mais para ajudar dentro de casa”, disse a presidente. 

Rosimeire conta que, ao longo desses 22 anos de atuação nos assentamentos, os moradores se conscientizaram sobre agroecologia e extrativismo. No entanto, no início da associação, o desafio consistia em criar confiança na comunidade. “Bem no começo, os maridos não deixavam [elas participarem], a gente tinha que ir casa por casa para fazer as reuniões para o marido ficar escutando, porque a gente tava falando para elas. No caso, eles diziam que a gente só ia colocar “minhoca” na cabeça das mulheres. Agora o grupo é tudo para eles porque está entrando dinheiro, mas no começo foi muito desafiador”, explicou Kezia Cristina da Cruz Silva, técnica da FASE que acompanha a ARPEP. 

A presidente Rosimeire conta que a principal mudança percebida nas comunidades após atuação da ARPEP e da FASE foi a consciência de que era possível transformar aqueles frutos em fonte de renda: “Antes, a gente não sabia que a gente poderia transformar aquele produto em renda para a nossa casa. E aí depois nós percebemos que era uma alternativa e hoje você vê como que mudou. Nós éramos sete lá no meu grupo, hoje nós estamos entre 23 mulheres. As adolescentes terminam o terceiro ano, estão fazendo faculdade aqui na cidade, mas no final de semana vão lá pro sítio para estar junto com a gente na cozinha trabalhando”. 

Por ser uma associação extrativista, a ARPEP segue um cronograma próprio. De dezembro a final de janeiro é a época de coleta do Pequi para as mulheres do grupo “Amigas da Fronteira”. Elas congelam os frutos e trabalham com eles durante todo o ano. Durante o período escolar, todas as terças-feiras acontecem entregas de pães e bolachas para escolas de Cáceres. A técnica Kezia ressalta que as mulheres das comunidades são as que mais preservam e reduziram muito a utilização de agrotóxicos nas hortas. Elas trocaram produtos químicos por calda de pimenta ou de fumo – inseticidas naturais. 

Atualmente, a ARPEP produz aproximadamente 200 a 300 kg de biscoitos e bolos enriquecidos com farinha de babaçu, cumbaru e pequi, além do licor, óleo e farofa. A produção é feita  em cozinhas localizadas nos assentamentos, que seguem as normas sanitárias exigidas tanto pelo PNAE quanto pelo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), iniciativa do governo federal de compra direta de alimentos de agricultores familiares. 

Onde comprar

Para adquirir os produtos da ARPEP, é possível entrar em contato pelo telefone (65) 98408-4246 ou pelo e-mail arpep.extrativismo@gmail.com para realizar a encomenda. Entre os itens disponíveis estão o bombom de cumbaru por R$5 a unidade, farinha de pequi por R$60 o kg, farinha de cumbaru e farinha de babaçu por R$100 o kg cada, biscoitos por R$75 o kg, pães por R$45 o kg, óleos de 50 ml por R$50 e licores por R$15.

 *Sob supervisão de Adriana Mendes 

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