Por Iasmim Sousa*
Um estudo realizado por pesquisadores da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisa do Pantanal (INPP), obtido com exclusividade pelo eh fonte, aponta que trechos das rodovias MT-040 e MT-060 (Transpantaneira) são responsáveis por matar 12.570 animais silvestres por ano. Essa região serve como elo entre o planalto e a planície pantaneira de Mato Grosso.
O número de animais atropelados chega a 7.300 por ano na MT-040 e a 5.270 na MT-060. Por dia, são aproximadamente 35 animais nos dois trechos. O monitoramento foi realizado semanalmente entre 2017 e 2020.
Segundo as informações coletadas pelos professores da UFMT José Ricardo de Souza e Carlos Pereira do Santos, 595 animais são atropelados mensalmente no trecho da MT-040 que liga Cuiabá a Mimoso (distrito de Santo Antônio do Leverger) e 430 no trecho da MT-060 entre Várzea Grande até Poconé.
A pesquisadora Tainá Dorado, do INPP e responsável pela análise dos dados coletados, relata que 173 espécies foram identificadas. Sendo os mamíferos as principais vítimas, especialmente o lobete ou cachorro-do-mato, o tamanduá-mirim e a capivara. O sapo-cururu e o jacaré-do-Pantanal também são atropelados frequentemente.
Espécies ameaçadas de extinção
Já entre as espécies ameaçadas de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), estão cágado-do-Pantanal, cágado-cabeçudo, ema, jacu-de-barriga-castanha, bugio, macaco-da-noite, lobo-guará, gato-mourisco, raposinha, lontra, sagui-marrom, tamanduá-mirim, ariranha, macaco-prego e anta.
Durante o período de chuvas, trechos da MT-040 cruzam áreas alagadas e boa parte da rodovia tem como margem o rio Cuiabá, o que leva mais animais a estarem mais presentes no seu entorno.
“Alguns trechos apresentam lateralmente diversos canais com água que formam em alguns pontos verdadeiras lagoas marginais que atraem animais e os levam a atravessar a estrada. Além disso, a manutenção do acostamento desta rodovia é insuficiente, apresentando grande quantidade de vegetação. Isso dificulta o motorista a visualizar os animais. Esses fatores, combinados com o fato de algumas espécies serem naturalmente muito abundantes no Pantanal e a falta de alternativas para a movimentação segura nas estradas tornam mais altas as taxas de atropelamentos”, explicou a pesquisadora Tainá Dorado.
Segundo Tainá, o fluxo de veículos na Transpantaneira é mais intenso por causa de atividades turísticas na região, mas não se pode quantificar porque não há acesso à essa informação. “A avaliação preliminar dos dados mostra que mamíferos apresentam quatro pontos principais de atropelamento. Estamos agora avaliando quais são os trechos de ambas as rodovias onde mais ocorrem atropelamentos em relação aos demais grupos, para indicarmos onde e quais medidas de mitigação devem ser tomadas”, disse.
Os resultados preliminares do estudo, mostram que os atropelamentos de anfíbios, répteis e aves ocorrem com mais intensidade durante o período de chuvas, especialmente porque esses animais se movimentam para se reproduzir e procurar alimento. Já durante o período de seca, são verificados mais atropelamentos de mamíferos. O médico veterinário Jorge Salomão, da Base de Atendimento Ampara Pantanal (BAAP), confirma.
“Conforme vai secando, poucos locais ficam como fonte de água e na beira da rodovia Transpantaneira tem as pontes, que acumulam bastante água embaixo e normalmente são os últimos lugares a secar. Consequentemente, os bichos ficam mais próximos da estrada na seca e aí acaba aumentando o número de animais atropelados.”, explicou Jorge.
O médico ainda afirmou que durante as chuvas o trânsito de veículos é reduzido, pelas condições das rodovias, mas que durante a seca ocorrem a maior parte de atividades turísticas, por ser mais fácil visualizar animais nos safaris.
Criada em 2016, a Base de Atendimento Ampara Pantanal (BAAP) é a primeira base fixa de atendimento à fauna no Pantanal em Mato Grosso e conta com 100 hectares. Segundo dados da organização, 700 animais silvestres já foram diretamente impactados com os projetos realizados ali. No local há o atendimento de animais silvestres sobreviventes aos atropelamentos e impactados pelas queimadas.
“Na BAAP a gente tem toda a estrutura veterinária, inclusive equipamento de diagnóstico por imagem, raios X, ultrassom, para exame complementar. Então a gente consegue fazer todo esse atendimento. O atendimento funciona de duas formas, ou a gente recebe esses animais atropelados, seja da Secretaria do Meio Ambiente, seja do Bombeiro, do IBAMA, do ICMBIO, que resgatam e levam até a nossa base ou por resgate da própria Ampara Silvestre”, detalhou Jorge. Os resgates feitos pela organização são feitos mediante autorização da SEMA.
Medidas que podem reduzir os atropelamentos
Conforme a pesquisadora Tainá Dorado, uma medida que pode ser implementada e tem resultados positivos em diversos casos no país é a instalação de cercas ao longo das rodovias e a criação de passagens de fauna. A instalação dessas estruturas, no entanto, deve ser realizada a partir do monitoramento de pontos críticos e é necessário levar em consideração os hábitos dos animais presentes no bioma.
Outras medidas que podem ser implementadas são:
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Uso indicativo de placas, de redutores de velocidade e a sinalização por meio de faixas de pedestres coloridas e com imagens de patas de animais;
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Instalação de refletores ao lado do acostamento para alertar a fauna, pois refletem a luz dos faróis dos veículos e afugentam os animais;
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Criação de aplicativos para celulares que alertam as zonas de risco para colisões;
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Campanhas para a conscientização e sensibilização dos usuários das rodovias;
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Manutenção da rodovia para controle de fontes de atração de animais, tanto em relação às fontes de alimentos como de abrigo;
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Limpeza da vegetação no entorno da rodovia (acostamento ou faixa de domínio) para facilitar a visualização dos animais pelos motoristas;
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Adequação de pontes – pontilhões, galerias ou tubulações de drenagem – já existentes, uma vez que estas podem auxiliar a travessia de diversos animais.
* Estagiária sob supervisão de Adriana Mendes