Movimentos sociais cobram mais participação na COP

Coluna de Francisca Mendeiros

Um momento vibrante que certamente será lembrado dessa COP30 será a Marcha dos Povos Pelo Clima, realizada em Belém no último sábado, 15 de novembro, Dia da Proclamação da República. Estimadas 70 mil pessoas foram para as ruas e mostraram que têm pressa em ver ações efetivas de combate às mudanças climáticas, cujos efeitos atingem a todos, mas são sentidos com mais impacto pelas comunidades periféricas.

O protesto foi organizado por integrantes da Cúpula dos Povos e COP das Baixadas.  Realizada entre os dias 12 e 16, a Cúpula dos Povos teve a participação de 1,3 mil movimentos sociais e organizações de todo o mundo que cobraram medidas concretas e o compromisso dos líderes mundiais na implementação dos acordos firmados. Realizado no campus da Universidade Federal do Pará, o evento foi uma resposta ao fato de que movimentos sociais são colocados à margem dos espaços de decisão.

A COP das Baixadas é uma coalizão de dez organizações comunitárias e coletivos periféricos de Belém que denuncia os impactos da crise climática sobre essas comunidades vulneráveis e trabalha com arte, educação, mobilidade urbana, agroecologia e justiça ambiental.

O alerta dado na Marcha dos Povos pelo Clima foi coeso e forte e teve a marca da diversidade no trajeto de 4 quilômetros e meio. Os movimentos sociais, culturais e políticos, indígenas, quilombolas, camponeses e ribeirinhos de 65 países atraíram milhares de apoiadores e conseguiram marcar um contraponto às agendas oficiais que tomam muito tempo de negociação com resultados tímidos.

E cobraram principalmente “participação e protagonismo dos povos na construção de soluções climáticas, com o reconhecimento dos saberes ancestrais”, como escreveram na declaração entregue ao fim da Cúpula dos Povos ao presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago.

As ministras do Meio Ambiente, Marina Silva, e dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, participaram do protesto. Sônia ressaltou que a solução da crise climática passa por essas comunidades que são “guardiãs da vida” e pela construção de um novo “mapa do caminho”. E Marina saudou a ocupação das ruas. “Em outras realidades políticas do mundo as manifestações eram feitas apenas dentro do espaço da ONU, agora, no Brasil, um país do Sul Global, de uma democracia conquistada e consolidada, sejam bem-vindos às praças”, disse.

Entre as propostas da declaração final da Cúpula dos Povos constam a demarcação e proteção das terras e territórios indígenas e de outros povos e comunidades locais; a reforma agrária popular com fomento à agroecologia; o combate ao racismo ambiental e a construção de cidades justas e periferias vivas; a exigência do fim da exploração de combustíveis fósseis, em particular na Amazônia e demais regiões sensíveis e essenciais para a vida no planeta.

Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

Quanto ao financiamento climático internacional, a proposta é que não passe por instituições que “aprofundam a desigualdade entre Norte e Sul, como o FMI e o Banco Mundial”. O presidente da COP30 prometeu ontem, durante o encerramento da Cúpula dos Povos, levar as reivindicações para as reuniões de alto nível nessa semana.

Vale registrar que essa conferência é a que registrou até agora a maior participação de indígenas brasileiros. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) estima que são ao menos 3 mil participantes e explica que entre as principais reivindicações estão a demarcação e a proteção das suas terras.

E ninguém está quieto, à espera dos acontecimentos. Um exemplo é o protesto de representantes do povo Munduruku, na última sexta-feira, que bloqueou a entrada da Bluezone, que é o centro diplomático da conferência. Com isso, os manifestantes conseguiram se reunir com André Corrêa do Lago e a ministra Sonia Guajajara. O grupo pediu esclarecimentos sobre as demarcações de dois territórios e a revogação do decreto que cria o Plano Nacional de Hidrovias e elege os rios Tapajós, Madeira e Tocantins como prioritários para a navegação de cargas. As autoridades prometeram dar encaminhamento aos pedidos.

Talvez o movimento de maior impacto das comunidades locais de diferentes regiões do planeta – África, Ásia, América Latina e Caribe – seja a mobilização para a construção de sua própria instância política internacional: o Fórum Global de Comunidades Locais sobre Mudanças Climáticas (GFLCCC), lançado nessa COP. É o início de uma articulação que pode garantir mais protagonismo nas negociações climáticas da ONU e a expectativa é que esse fórum se torne o marco, o antes e o depois, da participação social.

Na primeira semana da COP30, de fase técnica, os negociadores não conseguiram consenso em muitos temas, como a pauta da adaptação climática e o financiamento para transição dos países mais pobres. E essa última semana começa com as reuniões de alto nível nas quais os ministros de estado e os representantes do alto escalão de governos precisam tomar decisões políticas. Na sexta-feira, dia 21, último dia da conferência, saberemos se haverá os meios para implementação das medidas que podem impedir que o planeta continue aquecendo e colocando em risco a vida como conhecemos.

 

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